terça-feira, 11 de agosto de 2009

ártemis

eu sempre quis um irmão. sempre quis alguém que subisse em árvores e brincasse na terra, e fizesse túneis e muralhas na areia (o castelo sempre foi uma desculpa para as passagens subterrâneas), alguém que comigo não tivesse medo de fantasmas e saísse de lanterna em punho desbravando o quintal de madrugada. sempre, sempre quis alguém que corresse comigo e tivesse os joelhos escalavrados, alguém que também ouvisse da servente do colégio que desse jeito você nunca vai poder usar saias quando crescer (no caso dele acredito que ela diria “bermudas”, ou talvez nada – o mundo é injusto), alguém que subisse comigo no telhado e olhasse as estrelas fingindo um telescópio, ou – ainda no telhado – alguém que fizesse mímica de qualquer instrumento musical. sempre quis alguém que gostasse de passar o máximo de minutos debaixo d´água, ouvindo o coração da água bater, o coração que na verdade é o nosso.


sempre quis alguém que descobrisse comigo as quedas, as outras quedas, que fizesse fogueiras para queimar brinquedos e diários, que soubesse das fases e do ritmo da lua, que conversasse com as plantas e conspirasse contra a lei e a ordem. sempre quis alguém que fosse capaz de se sentar ao meu lado e me abraçar em silêncio enquanto eu chorasse a dor do mundo, como se naquele minuto tudo coubesse em mim e eu não desse conta, eu sempre quis alguém que me abraçasse em silêncio sem me recriminar.


eu sempre quis alguém que amasse correr e queimar, e que amasse as alturas e mergulhar e as árvores, e que nunca tivesse medo de nada.


eu sempre quis um irmão, mas só me apareceram fracos.

Um comentário:

  1. sempre quis um coração, mas só tive o meu.

    Obrigado pelo comentário no Pássaros. Belos vôos, os seus!

    Rodrigo

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